Texto e fotos: Fernando Martinez
As duas primeiras partes da turnê especialíssima do JP na Copa do Mundo sub-17 foram marcantes. Tanto os jogos em Goiânia quanto os do Distrito Federal foram geniais, agora, a terceira e última parte, que começou com o duelo entre Holanda e Senegal, foi absolutamente sensacional, principalmente por causa do belíssimo Estádio Kléber Andrade, a casa do mundial no Espírito Santo.
Após ver o clássico entre Vitória e Rio Branco no começo da tarde com a dupla Bruno/Caio, atravessamos os dez quilômetros entre os dois campos e em menos de meia hora já estávamos em Cariacica. A visão para quem chega é deslumbrante. Quando entramos, é um assombro. Visitei dezenas e dezenas de estádios na minha vida e nunca vi nada parecido em termos de arquitetura. A primeira impressão que temos é de estarmos entrando numa nave espacial. Nenhuma foto ou vídeo consegue passar a impressão exata da grandiosidade do lugar.
Passei do portão de entrada e fui direto até a sala de imprensa. Mais modesta do que a do Bezerrão e um pouco maior do que a do Olímpico e da Serrinha na capital goiana. Conversei rápido com os voluntários da FIFA, todos bastante simpáticos, e logo fui ao gramado. O espaço ao redor do tapete verde é enorme e as instalações são novas. Já estava meio fora do ar e foi só pisar no relvado que realmente percebi que estava com uma sensação rara, algo que tive em poucos campos que me fiz presente na vida.
O anel completo que cobre as arquibancadas inspiradas em obras do artista holandês Piet Mondrian é majestoso. As cabines são grandes e dignas de um lugar desse naipe. Bancos de reservas de categoria, vestiários espaçosos, potentes refletores que iluminam com propriedade. Todo o contexto deixa a experiência de ver uma partida de futebol no Kléber Andrade ainda melhor. Repito: nunca tinha visto algo desse jeito. Os responsáveis pela obra grandiosa merecem todos os parabéns.
As arquibancadas do Kléber Andrade são espetaculares. O estádio todo é espetacular. Vontade de colocar dezenas de fotos, mas vão só três para ilustrar como a cancha é maravilhosa
A cancha não era assim originalmente. O antigo Kléber Andrade foi inaugurado em 1983 e tinha o Rio Branco como dono. O projeto original previa a capacidade de 80 mil pessoas, mas ele nunca foi concluído. O recorde de público foi em 1986 num triunfo do Capa Preta em cima do Vasco da Gama no Brasileiro daquele ano: 32.328 pagantes. Em 2008 o complexo foi vendido ao governo do estado em virtude do grande número de dívidas do alvinegro. Dois anos depois começaram as obras de remodelação, nada mais do que uma reconstrução, e a reinauguração aconteceu em 2014.
Como infelizmente os clubes capixabas estão fora das divisões maiores do nacional há muito tempo, coube aos grandes do Rio registrarem os maiores públicos na nova fase. O Flamengo levou quase 20 mil pessoas em compromisso da Série A de 2016 e o Vasco cerca de 16 mil no Carioca do mesmo ano. Além disso, até o Beatle Paul McCartney tocou lá no final de 2014. Provavelmente a presença mais ilustre na história de 36 anos do complexo. Em 2019 é a vez da Copa do Mundo sub-17 dar as caras por ali.
O Kléber Andrade recebeu pelejas das chaves C, D, E e F. Na quarta, foi a vez da segunda rodada do Grupo D. Os trabalhos começaram com o encontro entre a Holanda e a genial seleção de Senegal, que debuta este ano no campeonato. A molecada laranja chegou no mundial sem problemas. Disputando o europeu sub-17 da UEFA com mais quinze seleções, na fase inicial venceram Inglaterra e Suécia, foram derrotados pela França e chegaram nas quartas. Aí aplicaram um 3x0 tranquilo na Bélgica e ficaram com uma vaga no mundial. Na semi venceram a Espanha e na decisão golearam a Itália. Foi a quarta vez que levaram o título, todos na atual década. Após cinco anos, voltei a ver a gloriosa camisa dos vice-campeões de 1974, 1978 e 2010. Em 2014 os vi em ação três vezes durante a Copa do Mundo do Brasil: o 3x2 contra a Austrália, o 2x0 em cima do Chile e a decisão do terceiro lugar com o fácil 3x0 no moribundo selecionado tupiniquim.
O detalhe é que os Leões, estreantes na minha Lista, só conseguiram vir ao mundial no tapetão. Na Copa Africana de Nações da categoria, disputada na Tanzânia no mês de abril, eles foram eliminados na primeira fase ao ficarem em terceiro em chave que tinha Guiné e Camarões. Com isso as duas carimbaram o passaporte ao Brasil junto com Angola e Nigéria. Acontece que a federação de Senegal entrou com uma reclamação na CAF alegando que Guiné utilizou dois atletas acima da idade no torneio. A alegação tinha fundamento, os guineenses foram eliminados e a vaga ficou caiu no colo dos senegaleses. Da minha parte, muita comemoração já que Guiné estava na Lista desde 2015 quando vi a derrota deles para o escrete canarinho na Copa do Mundo sub-17 do Chile.
As imagens de Holanda e Senegal posados antes do segundo confronto de cada um na Copa do Mundo sub-17
Apesar dos holandeses chegarem com a moral alta, eles foram surpreendidos na estreia com uma derrota improvável por 3x0 contra o Japão. Os africanos fizeram diferente e venceram os Estados Unidos por 4x1, fora o baile. Precisando vencer, o escrete da terra de Vincent Van Gogh até começou bem, porém sofreu com o rápido adversário e foi castigado com um novo revés, complicando bastante sua situação.
O início promissor foi premiado com o gol aos nove minutos. Taabouni cobrou escanteio, Rensch raspou de cabeça e Bannis completou. Senegal respondeu aos doze com o tento de Samba Diallo, só que o lance foi anulado pelo VAR. Aos 17, nova intervenção eletrônica com outro gol anulado, agora de Bannis, da Holanda. Os holandeses seguiram atacando e Bannis, o melhor do setor ofensivo, obrigou Ba a fazer grande defesa em tiro dentro da área aos 23.
A equipe europeia permaneceu dominando e os africanos voltaram a assustar somente uma vez aos 36 com Souleymane Faye mandando pela linha de fundo. A etapa inicial terminou com o triunfo parcial holandês. Imaginei que os senegaleses chegariam com tudo no segundo tempo, o que não imaginava é que seria tão rápido. Antes do relógio chegar ao primeiro minuto, Pepe Sarr arriscou de longe, a pelota resvalou em Maatsen e enganou Raatsie. Tudo igual no Kléber Andrade.
O colorido das camisas não foi o que esperava, mas um confronto entre Holanda e Senegal não é nada ruim
Naoufal Bannis (9) chutando para abrir o marcador a favor da Holanda.
Naci Unuvar (11) e Mikayil Faye (15) vendo a bola passar
Naoufal Bannis (9) escorando de cabeça bola levantada da direita
Outro lance de Naoufal Bannis (9), agora pela lateral direita
Cheikhou Ndiaye (5) e o camisa 9 holandês em lance no meio-campo
A Holanda sentiu o gol e nos minutos seguintes só deu Senegal. Aos 12 Insa Boye perdeu dentro da pequena área e aos 14 Faye finalizou com perigo. Aos poucos tudo foi ficando equilibrado de novo e rolou chance dos dois lados. Braaf mandou na trave aos 33, aos 35 o arqueiro africano fez dois milagres e Bogarde desperdiçou a sobra e aos 37 o glorioso Balde recebeu passe de Diaw e chutou em cima de Raatsie.
Na sequência o mesmo Balde, sucesso de nove entre dez lojas de utilidades domésticas, chutou de longe, o goleiro defendeu e no rebote Bogarde cometeu pênalti em Diaw. Pepe Sarr cobrou bem e virou o marcador aos 41. Os laranjas se mandaram desesperados na busca por um novo empate e deixaram o campo de defesa sem proteção. Resultado, num contra-ataque perfeito aos 48 minutos, Sarr lançou Balde, ele seguiu sozinho, driblou o arqueiro e tocou sem marcação.
Pape Sarr (18) cometendo falta no ataque senegalês
Melayro Bogarde (3) sofrendo carga de Souleymane Faye (9)
Ki-Jana Hoever (2) e Mouhamadou Diaw (10) apostando corrida na esquerda do ataque africano
Anass Salah Eddine (5) cortando cruzamento dentro da área holandesa
Bola estufando as redes de Calvin Raatsie no gol de pênalti de Pape Sarr e a comemoração do camisa 18 de Senegal
Aliou Balde (7) chutando para fechar o placar e confirmar a vitória de Senegal em cima da Holanda
Placar final do duelo em Cariacica: a segunda vitória de Senegal e a segunda derrota da Holanda
O placar de Holanda 1-3 Senegal foi justo pelo que os Leões apresentaram e pelo que os europeus não aproveitaram. O segundo triunfo na Copa do Mundo sub-17 colocou o onze africano nas oitavas e complicou demais a situação laranja. Agora precisariam derrotar os Estados Unidos na rodada final e torcer para que entrassem como um dos terceiros colocados dependendo dos resultados dos outros grupos. Os campeões do velho continente certamente não contavam com isso.
Foi uma bela partida, só que a rodada ainda não tinha acabado. O jogo principal teve novo confronto de vencedores e perdedores da primeira rodada.
Até lá!
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Ficha Técnica: Holanda 1x3 Senegal
Local: Estádio Kléber Andrade (Cariacica/ES); Árbitro: Andres Jose Rojas Noguera (Col); Público: 2.492 pagantes; Cartões amarelos: Ian Maatsen, Melayro Bogarde, Ki-Jana Hoever, Insa Boye, Issaga Kane; Cartão vermelho: Melayro Bogarde 40 do 2º; Gols: Naoufal Bannis 10 do 1º, Pape Sarr 1, (pênalti) 42 e Aliou Balde 50 do 2º.
Holanda: Calvin Raatsie; Ki-Jana Hoever, Melayro Bogarde, Devyne Rensch e Anass Salah Eddine; Ian Maatsen e Youri Regeer (Kenneth Taylor); Naoufal Bannis (Sontje Hansen), Mohamed Taabouni, Naci Unuvar (Djenairo Daniels) e Jayden Braaf. Técnico: Peter Van Der Veen.
Senegal: Ousmane Ba; Cheikh Diouf, Cheikhou Ndiaye, Birame Diaw e Mikayil Faye; Amete Faye, Samba Diallo (Aliou Balde), Issaga Kane, Pape Sarr e Insa Boye (Mouhamadou Diaw); Souleymane Faye. Técnico: Malick Daf.
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