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sexta-feira, 3 de junho de 2016

JP na Argentina 9 (1/9): El Cartero versus Gallo pela Primera B

Texto e fotos: Fernando Martinez


Todo mundo que acompanha futebol de verdade, aquele longe do foco da "mídia especializada", sabe que o Brasil não é o país do futebol... fato. Difícil saber quem pode ter essa honra, mas entre todos os candidatos a esse troféu com certeza a Argentina é postulante forte ao primeiro posto. No último mês de abril, sete anos após minha primeira visita a Buenos Aires, peguei meu passaporte e armei minha segunda viagem ao nosso vizinho.

Tudo bem, confesso que o motivo principal da minha ida dessa vez nem foi o futebol em si, porém isso não vem ao caso num blog que fala somente sobre futebol. O que importa é que mesmo com a agenda apertada consegui armar um cronograma monstro e bati cartão num total de nove pelejas, além de um em Montevidéu, na primeira incursão do JP em terras uruguaias em todos os tempos. Seriam muito mais partidas, só que um tornado mudou todos os planos (isso será contado em detalhes em breve).

Saí de São Paulo na tarde do dia 8 de abril com 32 graus na moleira e o tempo extremamente seco. Cheguei na capital argentina no meio da noite com uma temperatura de 12 graus e chuva fina, um presente divino. Desembarquei sem problemas e peguei um dos baratos táxis da capital federal. Não demorou para chegar no meu QG, localizado em frente ao Obelisco, coração da cidade.

Mesmo bastante cansado eu resolvi dar uma volta pelo centro para matar minha saudade dali. Olha, o lugar parece estar mais legal hoje do que estava em 2009. Por ser uma sexta-feira, os restaurantes estavam cheios, assim como livrarias, sebos, lojas de discos e os vários teatros que ficam na Avenida Corrientes, mesmo madrugada dentro. Respirei esse ar sensacional por algumas horas e então voltei ao hotel para minha primeira noite fora de casa.


Visão absolutamente sensacional da janela do quarto aonde me hospedei no centro de Buenos Aires. A primeira parte da viagem teve essa vista

A ideia era fazer uma rodada dupla no sábado, mas no fim acabou rolando de assistir "apenas" uma partida só. "Apenas" com as aspas pois é claro que não dá para reclamar de ter feito a reestreia portenha com o confronto entre o sensacional Club Comunicaciones e o genial Club Deportivo Morón na cancha do primeiro, o Estadio Alfredo Ramos. A peleja foi válida pela 10ª rodada do Campeonato de Primera B, a terceira divisão nacional.

As cinco divisões do Argentino realizadas nesse primeiro semestre são bastante peculiares. Todos estão sendo chamados de "campeonatos de transição", pois terminarão agora em junho. Isso porquê a AFA irá realinhar seu calendário com o calendário europeu a partir de agosto. Os vinte times participantes jogam entre si em turno e o campeão subirá para a Primera B Nacional.


Escudos de Comunicaciones e do Deportivo Morón, adversários na primeira partida na edição 2016 da série "JP na Argentina"

A casa do Comu fica na Zona Norte da cidade, a dez quilômetros de distância do Obelisco. Chegar ali de transporte público é a maior moleza, já que a Estaçao Francisco Beiró, que faz parte da Linha Urquiza dos "Ferrocarriles" locais, fica a menos de mil metros dali. Como eu estava um pouco atrasado, fui de táxi e gastei cerca de 100 pesos, ou 25 reais, para chegar lá.

O time do bairro de Agronomía foi fundado em 1931 por empregados dos correios como Club Atlético Correos y Telégrafos. Em 1953 o nome foi alterado para Club Comunicaciones. No mesmo ano, a agremiação recebeu do presidente Perón um enorme terreno de 16 hectares para a utilização como um clube social.

O número de instalações esportivas ali é enorme. O local tem, além do estádio, vários campos de treino, ginásio, restaurante, quadras de tênis, campo de rugby e até uma faculdade. Juro que não imaginava que a infra-estrutura tão imponente assim. O lugar é tão imenso que demorei alguns minutos para encontrar o portão de entrada. Na acanhada bilheteria comprei meu ingresso para a "platea" no calor de 200 pesos - equivalente a pouco menos de 50 reais, salgado para nossos padrões - e logo fui para o meu lugar.

Na internet há a informação que a capacidade do Alfredo Ramos é de 3.500 pessoas, porém aparentemente não é bem assim. O estádio tem arquibancada apenas em uma das laterais e mesmo que apertassem bem, não caberia esse número de pessoas nem em sonho. Tanto é assim que as dependências estavam cheias de "hinchas" dos dois clubes e o público oficial foi de 300 pagantes. Isso não muda o fato que o local é muito aconchegante e ótimo bom para se ver um jogo de futebol.



Fachada e entrada do Estadio Alfredo Ramos, casa do Club Comunicaciones


Parte central da "platea" da casa dos Carteiros


Cabine principal de imprensa


O escudo do Comunicaciones está representado em vários lugares da praça de esportes, aqui na entrada de um dos banheiros

Falando do encontro futebolístico da tarde em si, esse é um confronto bastante comum nas divisões de acesso do Argentino desde os anos 70. Nessa temporada o Deportivo Morón, equipe fundada em 1947, vinha fazendo uma campanha um pouco melhor do que o Comunicaciones. O Gallo até então era o oitavo colocado enquanto os Carteiros estavam em antepenúltimo, tendo vencido apenas na primeira rodada e amargando em jejum de dois meses sem triunfos.

Para a alegria da animada hinchada do Comu, os donos da casa fizeram uma grande apresentação e não deram muitas chances para o Deportivo. Logo aos 14 minutos, o camisa 9 Nicolás Ibañez se aproveitou de um erro do goleiro Alvarez e abriu o marcador.

O jogo continuou melhor para os locais e muito disputado. Entre um lance e outro parava o olhar e assimilava tudo que acontecia ao meu redor. Apesar de estar em outro país e inserido numa cultura diferente, os mesmos personagens que existem aqui, existem lá. A diferença fica por conta das torcidas. Eles não param um minuto sequer, bem diferente do que acontece aqui no Brasil, aonde salvo raras exceções, a presença de público é diminuta.

Outro lance genial é que a linha do trem fica logo atrás do gol dos fundos do Alfredo Ramos e por várias vezes o trem passou por lá durante a partida. No último minuto do tempo inicial o Morón teve um atleta expulso e os atletas foram para os vestiários com o marcador indicando a vantagem mínima do time mandante.


Esse foi um dos maiores lances de perigo a favor do onze local no primeiro tempo. A bola foi cruzada na pequena área mas não apareceu ninguém para completar


Atacante local fazendo o corte após escanteio a favor do Morón pela direita


Visão geral do Alfredo Ramos e sua bucólica paisagem

No segundo tempo o futebol melhorou e o Deportivo voltou disposto a deixar tudo igual. Na primeira chance de perigo a favor dos visitantes quase saiu o empate. Rossi perdeu gol feito em forte cabeçada que teve defesa incrível de Giovini. Minutos depois um dos defensores do Comunicaciones salvou uma bola em cima da linha depois de chute pela direita.

Como quem não quer nada, os Carteiros foram se soltando aos poucos e aos 23 minutos conseguiram ampliar a vantagem com um belo gol de Barrionuevo. Apesar de terem tentado pelo menos diminuir o prejuízo, o Morón não foi capaz de anotar o gol de honra. Melhor para os comandados de Jorge Vivaldo, que fazia apenas sua segunda partida no comando do Comu.


Chute de fora da área para o Comunicaciones


O Deportivo tentou pelo menos anotar o gol de honra, aqui em lance pela lateral, mas não teve sucesso


Disputa de bola no meio-campo


Bola levantada na área dos donos da casa no fim do jogo


Outra investida do insistente ataque do Deportivo Morón no tempo final

O placar final de Comunicaciones 2-0 Deportivo Morón quebrou o jejum do onze preto e amarelo e melhorou um pouco a situação do clube na tábua de classificação. Posso dizer que dei sorte para a equipe, pois desde então o time não perdeu mais. Hoje, faltando duas rodadas para o final da Primera B, a equipe ocupa a sexta colocação e mesmo sem chances de acesso, a campanha merece ser louvada. O Morón ainda tem chances, mesmo remotas, de subir para a Primera B Nacional.

Como sempre faço em viagens, permaneci nas dependências do estádio até o último momento possível fazendo fotos e mais fotos para os meus arquivos. De acordo com meu cronograma, o futebol continuaria na pauta com outro jogo logo, agora pela principal divisão do Argentino. Só que não sabia de um pequeno detalhe: não existem ingressos à venda para essa divisão na data da peleja. Ou seja, fui até o Monumental de Nuñez para colocar o Sarmiento na Lista e perdi a viagem. Até tive a oportunidade de comprar um ingresso com um cambista que parecia o Gardelón, pena que pagar 200 reais por isso me pareceu uma alternativa um tanto quanto absurda.

Voltei para o hotel e armei aquele esquema na base dos embalos de sábado à noite com louvor. Muita andança pelo centro, paradas nas livrarias e sebos e fim do passeio numa pizzaria ótima na Corrientes. A viagem estava apenas começando...

Até a próxima!

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