Texto e fotos: Fernando Martinez
No final de 2019 o Estádio Walmir Campelo Bezerra, o Bezerrão, foi o principal palco da Copa do Mundo sub-17. A cancha recebeu 18 partidas, incluídas aí as duas semifinais, decisão de terceiro lugar e a decisão épica decisão entre Brasil e México. Menos de quatro meses depois retornei ao local num cenário completamente diferente. Na pauta, o duelo entre Paranoá e Taguatinga pela 9ª rodada do Campeonato Brasiliense da Primeira Divisão.
Eu fui seis vezes no campo do Gama durante o Mundial. Peguei o Brasil na primeira fase e também na final, talvez no maior e mais importante momento que tive nesses 37 anos de futebol. Naquele 17 de novembro, figuras como Ronaldo, Cafu e Gianni Infantino também estavam presentes, todos bem próximos do que vos escreve. No domingo passado, nenhum figurão, nenhuma personalidade, poucos jornalistas e o estádio quase vazio. Um cenário completamente diferente e com mais cara de Jogos Perdidos.
Junto com a dupla Raul e Caio, cheguei na bela praça esportiva bem cedo e a diferença da região comparando com a época do mundial era enorme. Estacionamos o carro literalmente no portão principal e em cerca de dois minutos eu já estava no gramado. Como o Data Fernando informou naquelas matérias, vale lembrar que o local foi inaugurado em 1977 e reinaugurado após grande reforma em 2008 no polêmico amistoso entre Brasil e Portugal que teve triunfo tupiniquim por 6x2. Hoje a capacidade é de 20.310 pessoas, mas apenas 46 testemunhas pagaram ingresso no domingo.
Placa comemorativa da reinauguração do Bezerrão em novembro de 2008 com o polêmico Brasil 6x2 Portugal
A bela parte coberta do Bezerão ainda com boa parte da decoração da Copa do Mundo sub-17
Agora vamos ser justos, não tinha como esperar muito público, já que o lanterna do campeonato era o mandante. O Paranoá Esporte Clube, atual campeão da segundona do DF, ocupava a lanterna antes da nona rodada. Uma campanha horrorosa com apenas um empate, sete derrotas e um saldo negativo de 19 gols. Fundados em 2000, irão completar 20 anos no próximo mês de abril provavelmente com novo rebaixamento na sacola.
Não era exagero nenhum em dizer que o genial Taguatinga EC era favorito contra o PEC. Com 12 pontos, ocupavam a quarta colocação e ainda lutam por uma vaga na semi final do Candangão. O alviazul foi um dos times que mais acompanhei nos tempos da minha formação em futebol nacional, isso na segunda metade dos anos 80 e começo dos 90. Eu tinha certeza que não tinha a menor chance de vê-los em campo um dia.
Bom, antes de entrar nesse assunto específico, vale contar um pouco da história do clube: O Taguatinga surgiu em julho de 1975 depois que o Pioneira FC, o campeão do DF de 1974, mudou seu nome e também suas cores. Estrearam com a nova denominação no Torneio Imprensa, realizado no começo de 1976 e acabaram conquistando o caneco. No brasiliense, foram vice em 1978 e campeões pela primeira vez em 1981. Nos anos seguintes, quatro vices e quatro títulos: 1989 e o tri de 1991/1992/1993.
No decorrer dos anos 90 as más administrações deixaram o TEC atolado em dívidas. A péssima campanha em 1999, que culminou com um novo rebaixamento, junto com a saída do homem forte fez com que o departamento de futebol fosse desativado. A área social também não sobreviveu. Nunca mais foi levantada a hipótese de retorno do Taguatinga aos gramados... Isso até 2015...
Aí entra na história aquele que foi responsável pela volta do TEC. Fundado em 1994, o Comercial do Núcleo Bandeirante teve esse nome até 2000, quando passou a ser conhecido apenas como Bandeirante, e foi figurinha carimbada no estadual até 2014. Em 2015, eles fizeram as malas e se mudaram para qual cidade-satélite? Olha aí como as histórias se cruzam: Taguatinga. O novo nome passou a ser Clube Atlético Taguatinga.
O CAT disputou e ganhou a segundona de 2015 e a primeira em 2016 e 2017, quando foi rebaixado. Em junho de 2018 eles anunciaram que fariam uma fusão com o inativo, voilà, Taguatinga Esporte Clube. Durante o processo eles desapareceram e o glorioso TEC pôde finalmente voltar ao cenário futebolístico do Distrito Federal. Ganharam a segunda divisão do mesmo ano e retornaram à primeira em 2019, vinte anos após o desaparecimento.
O grande problema para o Taguatinga é que com o seu sumiço o Brasiliense ocupou com louvor o espaço vago ganhando nove títulos e cinco vices. A tarefa de reconquistar a torcida será árdua, e eu espero sinceramente que tenha final feliz. A média de público em casa nos quatro jogos realizados no Serejão é de apenas 127 pagantes. O fato de não ter ganho nenhuma vez como mandante - suas três vitórias foram longe de casa - certamente não ajudou muito.
Na rodada anterior, a Águia empatou sem gols contra o ex-lanterna Ceilandense. Jogando contra o novo último colocado, não queriam vacilar. Antes do apito inicial consegui conversar com alguns dirigentes e ver que, apesar das dificuldades comuns a 95% dos times "pequenos" do país, todos estão confiantes com o futuro do escrete azul e branco. Também aproveitei a deixa e comprei uma maravilhosa camisa retrô que lembra a utilizada no começo dos anos 90. É o tipo de oportunidade que não dá pra perder.
Paranoá Esporte Clube - Paranoá/DF
Taguatinga Esporte Clube - Taguatinga/DF
Capitães dos times junto com o quarteto de arbitragem composto pelo árbitro Maguielson Lima Barbosa, os assistentes Josieliton Silva dos Santos e David Sousa Santana e o quarto árbitro Rafael Tosta da Silva
Fiz as imagens oficiais de ambas agremiações, do quarteto de arbitragem e de uma cerimônia em homenagem ao Dia Internacional da Mulher. Depois fui acompanhar o ataque visitante. Se no Mundial tinha cordinha limitando os fotógrafos, espaços definidos e não podíamos nem mudar de lugar, dessa vez foi de boa e ninguém veio me atrapalhar. Fiquei sentado de boa no chão, longe do forte sol na linha lateral. Fiz bem, pois durante boa parte do primeiro tempo só teve ação nessa parte do campo.
Não demorou para o Taguatinga abrir o placar. Aos 11 minutos, Denilson invadiu a área pela esquerda e foi derrubado pelo zagueiro. Lucas Victor bateu e a bola tocou na trave antes de entrar. O time chegou perto do segundo gol por algumas vezes e isso aconteceu finalmente aos 29. Regino cobrou falta da direita, o goleiro Cesinha caçou uma borboleta monstra e Dogão cabeceou para o gol vazio.
Ismar Reis (8) no campo de defesa do Paranoá
O Taguatinga começou bem e durante a primeira meia hora o Paranoá não conseguiu passar do meio-campo
Lucas Victor abrindo o placar a favor do TEC em cobrança de pênalti
O 1x0 não sossegou o time visitante, que continuou ocupando o campo de defesa local
Detalhe do segundo gol do Taguatinga, marcado por Dogão de cabeça após falha do goleiro do Paranoá e a comemoração do atleta da Águia
A peleja seguiu com o Taguatinga segurando a vantagem na boa e foi com o resultado parcial de 0x2 que o intervalo chegou. Fui conhecer os corredores do Bezerrão que eram exclusivos das seleções e do pessoal da FIFA na época da Copa do Mundo sub-17 e pude ver que realmente é um belo estádio. Voltei ao gramado e novamente acompanhei os avantes visitantes ... só que dessa vez não foi uma boa.
O Taguatinga voltou ao gramado mostrando uma preguiça monstro. O Paranoá melhorou demais e passou a ameaçar a vantagem adversária em vários momentos. Aos 4 minutos Diogo fez sua primeira boa defesa em cobrança de falta de Kaká. Na sequência Gabriel perdeu gol feito a favor dos locais.
Na base do bumba-meu-boi o onze mandante foi chegando, chegando, chegando e, de tanto insistir, diminuiu aos 22 minutos com vacilo da zaga e boa conclusão de Guilherme. O Taguatinga acordou e chegou a fazer o terceiro aos 27, de novo com Dogão, mas o gol foi anulado por impedimento. O Paranoá se lançou com tudo nos minutos finais e Guilherme, o melhor do setor ofensivo, quase deixou tudo igual aos 36. Douglas Rato desarmou na hora H.
Cozinhando o galo, o Taguatinga conseguiu armar um bom contra-ataque aos 43 que acabou com as esperanças locais. Everton foi lançado em profundidade e tocou no canto de Cesinha. O arqueiro ainda tocou na pelota de leve, sem força suficiente para evitar o tento que fechou o marcador no Bezerrão. O escrete local mostrou bastante força de vontade... pena que não foi suficiente.
A única bandeira da FIFA ainda tremulando no estádio que sediou a final da última Copa do Mundo sub-17
Dois lances de disputa de bola no campo de defesa do onze local
O Taguatinga levou perigo basicamente nos contra-ataques no tempo final
O Paranoá, se não foi brilhante, mostrou muita força de vontade durante a segunda etapa
O terceiro gol do clube visitante foi marcado por Everton nesse chute. O tento decretou a queda do Paranoá para a segunda divisão
O resultado de Paranoá 1-3 Taguatinga rebaixou matematicamente a Cobra Sucuri para a segundona do Distrito Federal um ano depois de conquistarem o acesso. Já o TEC agora tem 15 pontos ganhos, quatro atrás do Formosa, quarto colocado. Como disse no começo do post, essa foi a quarta vitória e a quarta fora de casa. Não será fácil, porém as chances de classificação entre os quatro melhores da fase inicial ainda existem.
Feliz com os três jogos, dois estádios novos e quatro times a mais na Lista, saí da casa do Gama junto com os amigos e fui fazer uma visita ao Raul, o maior anfitrião do DF, em seu belo apartamento. Dali seguimos até uma lanchonete absolutamente sensacional no plano piloto - eles fazem um sanduba com chimichurri absolutamente espetacular - antes de voltar ao hotel. Daí foi só ter uma boa noite de sono antes de cruzar os ares do Centro-Oeste e do Sudeste com destino à capital bandeirante.
Bonita visão do quarto do hotel em que me hospedei na capital federal. Sabe-se lá quando terei outra vista assim
Tivemos um Especial do Mês em janeiro, um em fevereiro e um em março. Se tudo der certo irão rolar especiais em abril, maio e junho. Isso se não formos obrigados a entrar em quarentena e isso também se o futebol não parar. Confesso que estou preocupado com o futuro. Enquanto isso, voltaremos aos campos na semana com o início do Brasileiro sub-17, além de outro clube novo na Lista.
Até lá!
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Ficha Técnica: Paranoá 1-3 Taguatinga
Local: Estádio Valmir Campelo Bezerra (Gama/DF); Árbitro: Maguielson Lima Barbosa; Público: 46 pagantes; Renda: R$ 920,00; Cartões amarelos: Gabriel Neves, Lucas Victor, Luan; Gols: Lucas Victor (pênalti) 11 e Dogão 29 do 1º, Guilherme 22 e Everton 42 do 2º.
Paranoá: Nilton César; Vitinho, Fabinho, Dedé e Kaká; Hélio, Dogão (Brendon), Ismar Reis (Guilherme) e Ivan; Gardiel e Vinicius (Gabriel Neves). Técnico: Alcivandro Silva.
Taguatinga: Diogo; Douglas Rato, Dougão, Daniel Felipe e Denilson; Luan, Regino, Lucas Santos (Raphael Augusto) e Marquinhos (Junior Alves); Lucas Victor e Léo Veloso (Everton). Técnico: Jezimar Marques.
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