quarta-feira, 20 de novembro de 2019

JP na Copa do Mundo sub-17 (parte 14): Brasil tetracampeão do mundo!

Texto e fotos: Fernando Martinez


Nós do Jogos Perdidos completamos 15 anos de vida no começo do mês com cerca de 3.500 coberturas, boa parte delas exclusivas. Fizemos matérias em verdadeiros fins de mundo, passamos por roubadas insanas, sofremos com sol, chuva e frio e marcamos presença em dezenas de campeonatos diferentes. Eis que no último domingo nós fizemos, sem dúvida, nossa cobertura mais importante por uma série de motivos: a final da Copa do Mundo sub-17 entre México e Brasil no Estádio Walmir Campelo Bezerra, o Bezerrão.

Se pensarmos em partidas grandes, eu estive na abertura da Copa de 2014 entre Brasil e Croácia e na grande decisão do ouro no futebol masculino na Rio-2016. A emoção que senti nesses dois dias foi indescritível. O que fez a final de domingo ser diferente foi o fato de acompanhar tudo de perto, na beira do gramado. Como fui devidamente credenciado pela FIFA, pude ter esse enorme privilégio. Dos meus três mil jogos, foi o meu maior momento jornalisticamente falando.


Bezerrão começando a receber o público da final da Copa do Mundo sub-17

Cheguei na capital federal no sábado e no domingo teve cobertura de manhã. Do CT do CRESSPOM fui ao Gama e após a França derrotar a Holanda e ficar com o terceiro lugar da Copa, eu tinha merecidas duas horas de descanso. Fui ao centro de imprensa me esbaldar no forte ar-condicionado e no potente wi-fi disponibilizado no recinto. O mundo inteiro também estava lá, boa parte fazendo a estreia na decisão, claro. Duvido que a maioria estivesse ali se o Brasil tivesse ficado no meio do caminho.

Quando retornei ao gramado, aí caiu a ficha do que eu estava prestes a vivenciar de vez. Acostumado a ver dirigentes do Barcelona Capela, comissão técnica do Mauaense e torcedores do União de Mogi no dia a dia, foi bastante diferente esbarrar com Gianni Infantino, presidente da FIFA, e com Cafu e Ronaldo, convidados para respectivamente representarem o saudoso Itaquaquecetuba AC e o São Cristóvão do Rio. Fiquei ali observando tudo e a sensação era de surrealismo puro.



Gianni Infantino, presidente da FIFA, e Ronaldo. Duas pessoas que dificilmente voltarão a aparecer no JP algum dia


Cafu e Ronaldo, vigorosos representantes do Itaquaquecetuba AC e do São Cristovão, com a taça destinada ao campeão da Copa do Mundo sub-17 2019

O relógio correu rapidinho e, junto com uma penca de fotógrafos de todos os cantos, acompanhei as seleções irem a campo pois a hora da bola rolar tinha chegado. Essa foi uma espécie de "revanche" da decisão de 2005 quando, no Mundial do Peru, os norte-americanos derrotaram os brasileiros por 3x0 e foram campeões. Na história o Brasil tinha vencido o adversário do domingo apenas uma vez: 2x0 em 1985 na China, época em que o certame ainda era sub-16. Depois, além do revés de 2005, triunfo mexicano pela contagem mínima em 2009 e eliminação verde e amarela nos pênaltis nas quartas de 2013.



As seleções sub-17 do Brasil e do México posando para a foto oficial antes da decisão


O estádio do Gama recebeu 13.843 torcedores para a decisão

Em 2019 a campanha tupiniquim até o último compromisso foi perfeita: seis apresentações e seis vitórias. Na fase inicial venceram Canadá, Nova Zelândia - um 3x0 que contou com minha presença - e Angola. Nas oitavas eliminaram o Chile e nas quartas a Itália. Na semi fizeram a "final antecipada" com a França e perdiam por 2x0 até metade da etapa final. Depois disso, virada antológica com direito a gol de Lázaro no último minuto. Sendo da geração traumatizada com a França por 1984 e 1986, fiquei bem feliz.

O México sofreu um “pouco” mais até chegar na decisão. Estrearam com um horroroso empate sem gols contra o Paraguai e foram derrotados pela Itália. A classificação foi conquistada em goleada contra Ilhas Salomão. Nas oitavas e quartas superaram adversários asiáticos, respectivamente Japão e Coreia do Sul. Na semifinal tomaram sufoco da Holanda, seguraram um empate por 1x1 e bateram os europeus nos pênaltis. Contra o Brasil, buscariam o tri (além de 2005, levaram a taça em 2011).

O Bezerrão estava cheio e os presentes apostavam em uma atuação como a do segundo tempo contra os franceses. Os locais fizeram dez minutos burocráticos, porém quando se animaram, chegaram bem perto de marcar em vários momentos. Gabriel Veron quase fez aos 13 e aos 22. Já Peglow mandou na trave aos 17 e finalizou bem aos 18. O México assustou pela primeira vez aos 24 em falta de Álvarez que passou perto da meta. Veron assustou novamente aos 28 e Garcia defendeu. Kaio Jorge e Veron aos 44 assustaram a zaga visitante.


Daniel Cabral (5) em lance da direita do ataque brasileiro


O atacante Kaio Jorge (9) não conseguiu receber o cruzamento que partiu da direita


Henri (3) subindo no terceiro andar para cortar lançamento mexicano


Daniel Cabral (5) em lance pelo meio


Victor Guzman (3) ganhando de cabeça de Kaio Jorge (9)


Grande defesa de Eduardo Garcia em finalização de longe do ataque brasileiro

Se a gente sabe que desperdiçar um monte de oportunidade normalmente já é complicado, em final fica pior. O Brasil estava bem, só que o 0x0 no intervalo deu uma preocupada. O México já tinha mostrado qualidade e qualquer vacilo poderia ser fatal. Quando começou a segunda etapa, o selecionado verde e amarelo manteve o ímpeto ofensivo, o que mudou foi que os norte-americanos também passaram, mesmo que timidamente, a arriscar a sorte no setor ofensivo.

Antes dos vinte minutos, Peglow, por duas vezes, e Patryck fizeram o goleiro Garcia trabalhar. O gol parecia questão de tempo... e realmente era, mas quem marcou foram os mexicanos. Pizzuto cruzou da esquerda, Bryan González subiu entre dois zagueiros e testou para baixo, colocando a pelota no canto direito de Matheus Donelli. Decorridos 21 minutos, foi um enorme banho de água fria que deixou todo mundo dentro e fora de campo fora de combate por alguns minutos.

Eu deixei de me importar com a seleção na Copa do Mundo de 1998 e foram poucos os momentos que realmente torci com afinco. Dessa vez não consegui ficar indiferente. Sinceramente eu queria o quarto título e esperei que a virada acontecesse. Acontece que não foi nada fácil e a peleja teve todos os ingredientes de uma decisão de gente grande: sofrimento, sufoco, emoção e redenção.

Quatro minutos após sofrer o gol, o técnico Guilherme Dalla Dea colocou Lázaro em campo, o heroi da semifinal. Logo na primeira participação, ele recebeu bom passe de Gabriel Veron e bateu sobre o gol. O México estava encurralado e aos 35 o empate quase saiu em chute de longe de Daniel Cabral que bateu na trave. O detalhe é que, no começo do lance, Gabriel Veron foi derrubado dentro da área por Alejandro Gómez. Ninguém viu a penalidade, apenas o VAR. O árbitro da Letônia foi chamado na cabine e marcou. Kaio Jorge cobrou no canto direito e Eduardo Garcia quase defendeu. Com 39 minutos jogados, 1x1 no marcador.

Aos 40, Yan cruzou, a defesa cortou mal, Kaio Jorge dividiu com o goleiro e Alejandro Gómez, se redimindo do pênalti, afastou o perigo. A atmosfera no Bezerrão era eletrizante e todos acreditavam que o segundo gol sairia, muito lembrando do que tinha acontecido ali três dias antes. Dizem que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar e Lázaro provou que essa velha máxima não existe. O relógio apontava 48 minutos jogados quando Yan atacou pela direita e cruzou na área. A bola percorreu uma curva perfeita e encontrou o pé direito do camisa 20. O atleta do Flamengo bateu de chapa e venceu o arqueiro mexicano. Atletas, comissão técnica e torcida foram à loucura.

Acontece que o jogo não tinha chegado ao seu fim e aos 50 minutos o México teve uma falta pela direita. Foram segundos profundamente tensos até que Josue Martínez cobrou a infração. Enquanto a pelota voava até a grande área, nenhum barulho foi ouvido na cancha pois todos os presentes estavam sem respirar. Bryan González arranjou uma enorme brecha entre os defensores adversários e cabeceou livre. Para azar dos norte-americanos e sorte do onze verde e amarelo ele mandou pela linha de fundo e perdeu a chance de uma nova igualdade.


Peglow (10) em ofensiva verde e amarela pela esquerda


Escanteio a favor do Brasil com a zaga mexicana aliviando


Marcação norte-americana acompanhando em cima o ataque local


Gabriel Veron (7) tentando pelo alto


Bola na rede do arqueiro do México no empate brasileiro aos 39 do tempo final. Quem marcou foi Kaio Jorge em cobrança de pênalti



O chute e a comemoração do talismã Lázaro. O camisa 20 do Brasil entrou no segundo tempo para fazer história mais uma vez


Nos acréscimos o México quase chegou ao empate nesse lance de cabeça... mas a festa foi brasileira

Matheus Donelli cobrou o tiro de meta e o árbitro Andris Treimanis trilou seu apito pela última vez na noite. O placar eletrônico mostrava o resultado de México 1-2 Brasil. Foi o reinício de uma festa imensa com quase todos os presentes envolvidos. Após 16 anos, o Brasil voltava a ser campeão mundial. Somos penta no profissional e no sub-20 e agora tetra no sub-17. Foi apenas a segunda vez que os donos da casa conquistaram o torneio em 18 edições (a primeira foi com o próprio México em 2011). A péssima campanha no sul-americano do começo do ano com a eliminação na fase inicial foi definitivamente deixada de lado. Uma redenção magnífica.





A alucinada festa dos atletas brasileiros na conquista do tetra da Copa do Mundo sub-17

Eu estive em muitas partidas emocionantes na minha vida. Tanto na época em que era torcedor ferrenho como em tempos mais recentes. Presenciei viradas antológicas, disputas ferrenhas e consigo fazer uma boa lista de jogos que me marcaram. Dito isso, estar tão próximo de uma final assim realmente foi especial. Cresci acompanhando os mundiais de base, tanto que tenho lembranças dos títulos no Egito em 1997, Nova Zelândia em 1999 e Finlândia em 2003. O que eu não tinha ideia era que quando o tetra chegasse eu estaria presente dentro de campo. Garanto que a sensação é espetacular. Ainda mais levando em conta todos os perrengues que passei entre 2016 e 2017. Também tive a minha redenção pessoal.

Na sequência da comemoração Gianni Infantino retornou ao relvado junto com vários aspones para a cerimônia de premiação. Gabriel Veron ganhou a Bola de Ouro por ter sido o melhor atleta do certame. O holandês Sontje Hansen ganhou a Chuteira de Ouro pela artilharia e Matheus Donelli recebeu a Luva de Ouro como melhor goleiro. Foram entregues as medalhas pelo terceiro lugar, pelo vice e pelo título. Ficamos ali pertinho captando as imagens, mesmo com os voluntários mais atrapalhando do que ajudando.


Os três maiores artilheiros do certame: o francês Nathanaël Mbuku com a chuteira de prata, o holandês Sontje Hansen com a chuteira e ouro e Kaio Jorge com a de bronze


Os três melhores jogadores do torneio: bronze para o mexicano Eugenio Pizzuto, ouro para Gabriel Veron e prata para o francês Adil Aouchiche



França e México, respectivamente vice-campeão e terceiro colocado da Copa do Mundo sub-17





Já com troféu e medalhas, o palco do Bezerrão ficou ainda mais festivo com a conquista do Brasil

Com a coroação do Brasil da edição 2019 da Copa do Brasil sub-20, encerrei a gloriosa cobertura do JP no mundial. Você viu aqui todas as 24 seleções, todas as sedes e todos os estádios. Não há dúvida que foi a melhor forma de chegarmos aos 16 anos. Agradeço o auxílio do amigo Luciano Claudino e a companhia dos amigos Caio, Bruno, Raul e Renato Rocha nas catorze partidas que acompanhei ao vivo.

Encerrei os trabalhos junto com a dupla Caio e Raul com um ótimo jantar numa belíssima pizzaria de Brasília. Entre um pedaço e outro, já começamos a organizar a próxima grande viagem. Deve rolar já em janeiro durante a Copa São Paulo. A ideia é visitar o maior número de sedes possível.

Dormi o sono dos justos na noite de domingo e segunda-feira de manhã retornei à capital bandeirante. 2019 ainda não acabou e apesar de ter poucas coberturas restando na agenda, teremos boas finais no cronograma.

Até lá!

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Ficha Técnica: México 1x2 Brasil

Local: Estádio Walmir Campelo Bezerra (Brasília/DF); Árbitro: Andris Treimanis (Let); Público: 13.843 presentes; Renda: R$ 189.760,00; Cartões amarelos: Ali Ávila, Alejandro Gómez, Joel Gómez, Daniel Cabral; Gols: Bryan González 21, Kaio Jorge (pênalti) 39 e Lázaro 48 do 2º.
México: Eduardo Garcia; Emilio Lara, Alejandro Gómez e Rafael Martínez; Victor Guzmán, Eugenio Pizzuto, Josue Martínez e Bryan González; Santiago Muñoz (Joel Gómez), Israel Luna (Bruce El-Mesmari) e Efrain Álvarez (Ali Ávila). Técnico: Marco Ruiz.
Brasil: Matheus Donelli; Yan Couto (Garcia), Henri, Luan Patrick e Patryck; Daniel Cabral, Diego e Pedro Lucas (Matheus Araújo); Gabriel Veron, Kaio Jorge e Peglow (Lázaro). Técnico: Guilherme Dalla Dea.
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